segunda-feira, 6 de agosto de 2007

O Café Aroeira... XI

ELA
Não aguentei mais. Levantei-me e deixei-a a falar sozinha.

Olhei em redor.
As mesas quase todas ocupadas estavam vazias de ti.
O maestro tocava ao piano a canção que tinhas pedido, antes daquela mulher horrorosa se ter sentado à minha mesa: “let’s do it, let´s fall in love”.

Onde estás? Quero falar contigo ao menos uma vez. Procurei a tua mesa, o teu livro, o teu Gin tónico, a tua tranquilidade, os teus olhos.
O empregado de mesa fez-me um sinal e apontou as escadas que conduziam ao andar de cima.
Vou?
Não vou?
Vacilo, o coração diz-me para ir, a razão diz-me para não ir, “apetece-me histórias com fim feliz”.
Mas... tudo tem um fim.

Decido, saio pela porta, com o pensamento a mil, para trás deixo o “Rick´s Aroeira Café”.
- “De todos os bares, de todas as cidades do mundo, ele entra no meu”.

Sinto-me sufocar!
Descalço os sapatos e afundo os pés na areia, ando pela praia iluminada pela lua cheia, sinto o cheiro a mar, molho os pés, sento-me numa rocha e procuro respostas.

Ouço vozes! Vindas de “uma poça de água muito limpa e transparente toda rodeada de anémonas”:
- “Trago-te aqui uma flor da terra – disse; chama-se uma rosa.
- É linda, é linda – disse a Menina do Mar, dando palmas de alegria e correndo e saltando em roda da rosa.
- Respira o seu cheiro para ver como é perfumada.
A Menina pôs a sua cabeça dentro do cálice da rosa e respirou longamente.
Depois levantou a cabeça e disse suspirando:
- É um perfume maravilhoso. No mar não há nenhum perfume assim. Mas estou tonta e um bocadinho triste. As coisas da terra são esquisitas. São diferentes das coisas do mar. No mar há monstros e perigos, mas as coisas bonitas são alegres. Na terra há tristeza dentro das coisas bonitas.
- Isso é por causa da saudade – disse o rapaz.
- Mas o que é a saudade? – perguntou a Menina do Mar.
- A saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora.
- Ai! – suspirou a Menina do Mar olhando para a Terra. Porque é que mostraste a rosa? Agora estou com vontade de chorar.
O rapaz atirou fora a rosa e disse:
- Esquece-te da rosa e vamos brincar.” (In, a menina do mar, Sophia Andresen)

Vejo o rapaz e a Menina do Mar que não tinha mais do que um palmo de altura e era linda, a afastarem-se.
Apanho a rosa e sinto o perfume mágico. Uma pista?
Penso nas tuas palavras, no desejo, na importância da trajectória em detrimento da meta, no egoísmo, no direito ao prazer, no sonho, no risco da saudade.
Penso no teu sorriso, nas tuas mãos que não senti nas minhas, no teu olhar...
Apesar do risco da saudade...

Corro de volta ao “Rick´s Aroeira Café”, atravesso a sala até ao piano, ofegante digo ao maestro:
- Toque mais uma vez Sam. Pelos velhos tempos.
- Eu não sei o que quer dizer com isso senhorita Teka.
- Toque, Sam. Toque “As time goes by”... Cante Sam.

Corro pelas escadas até ao andar de cima com o coração aos saltos e as pernas a tremer. Procuro desesperadamente o teu olhar, o teu sorriso a tua mão...
Numa mesa, com vista para o mar, está um casal a jantar... bebem Duas Quintas, branco.
De ti... a tua ausência.

“...Na terra há tristeza dentro das coisas bonitas...”

Tarde demais!
A desilusão toma conta de mim, olho a Lua Cheia, aquela que menos gosto, reflectida no mar, brilhante, segura, provocadora, imponente, misturada com o piano de Sam...

“…Moonlight and love songs
Never out of date…”

Inesperadamente sinto os teus braços na minha cintura e os teus lábios quentes no meu ombro, na minha pele...
Voltaste!

Lembro-me de uma frase que li, “não existe fronteira entre o real e o imaginário”, não num pacote de açúcar!

Os meus olhos encontram os teus, o teu sorriso...
Pegas na minha mão, levas-me pela escada em direcção à porta...
Pelo caminho... Sam, empregado de mesa, carteiro, Chico, taxista, anónimo, sinónimo, fantasma, Leporello... levantam-se à nossa passagem e batem palmas.

“…No matter what the future brings…”

À porta do “Rick´s Aroeira Café” a tua mota, “verdadeiro cavalo alado”...

Com os teus olhos que riem e essa tua voz... convidas.
- Deixa-me, pelo menos hoje, ser eu a conduzir-te...

E fomos...
... à boleia do futuro...


[This day and age we're living in
Gives cause for apprehension
With speed and new invention
And things like fourth dimension.

Yet we get a trifle weary
With Mr. Einstein's theory.
So we must get down to earth at times
Relax relieve the tension

And no matter what the progress
Or what may yet be proved
The simple facts of life are such
They cannot be removed.]

You must remember this
A kiss is just a kiss, a sigh is just a sigh.
The fundamental things apply
As time goes by.

And when two lovers woo
They still say, "I love you."
On that you can rely
No matter what the future brings
As time goes by.

Moonlight and love songs
Never out of date.
Hearts full of passion
Jealousy and hate.
Woman needs man
And man must have his mate
That no one can deny.

It's still the same old story
A fight for love and glory
A case of do or die.
The world will always welcome lovers
As time goes by.

Oh yes, the world will always welcome lovers
As time goes by.
(Herman Hupfeld)

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