terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Música...

Um dia triste com uma notícia inesperada.
Sabia que as coisas não estavam bem mas acreditei sempre que era apenas uma fase má.
Tenho memórias, recordações, conversas soltas, momentos em casa dos nossos avós.
O  nosso último encontro, a dois, foi olho no olho a atualizar vida e coisas boas... tranquiliza-me.
Uma amiga de infância de vez em quando perguntava-me: Então e o teu primo que tocava saxofone à janela?
Continuará a tocar para sempre, dentro de nós.

Um poema
para o Luís Caldeira (1956-2019)
A Música amava-o
mas ele duvidava,
nem sempre se sentia amado,
por muitas palmas e enapás que se ouvissem.
E nisto éramos completamente iguais.
A diferença era que ele via uma saída,
uma outra vida, fora da Música
e eu, fora da Música, só via morte.
Dedicou-se, assim, de alma e coração à Medicina,
tornou-se um grande mestre, respeitado
pelos seus pares, estimado pelos seus pacientes;
e amou a Medicina com todas as suas forças.
Não saberei dizer se foi um amor correspondido.
A Sociedade, sim, sei bem que ama mais os médicos
do que os músicos.
Com os anos, foi tocando cada vez menos,
a flauta a ficar fechada dentro do estojo.
Um dia, a morte apareceu no horizonte
e disse-lhe que não tardava.
Diagnósticos e prognósticos já eram, para ele,
verdades demasiado transparentes,
mais transparentes do que aquelas modulações
da ópera Salomé que tanto o fascinavam.
Uns dias antes do fim, abriu o estojo da flauta
e voltou a tocar.

João Paulo Esteves da Silva